Com dois olhos quebrados, o garoto não enxergava bem o
mundo. Juntou 2 pedaços de vidro em cima do nariz e só assim as coisas ficaram
mais nítidas.
Toda aquela miopia não estava aí à toa. Morria de medo do
futuro.
E por isso, vivia fervorosamente o passado.
Sofria de nostalgia
aos 12 anos, quando se lembrava do primeiro grau e filosofava sobre como
aqueles tempos eram mais bem simples. De fato eram mesmo.
Aos 15 recordava-se de como era bom não ter que estudar
química física ou se preocupar com vestibular aos 14 anos. “Preferia quando era
só Ciências”, reclamava pra si.
Quando se formou no colegial e torcia por um dispensa no
serviço militar, falava pra quem quisesse ouvir que a angustia de ter ou não
passado do vestibular era muito melhor que aquilo tudo.
Já na faculdade, cursava História, por motivos que nem ele
sabia explicar muito bem.
Naquela tarde de inverno, a prova estava marcada para as 14
horas. Ele seguia explicando para o seu amigo o como a prova de ontem tinha
sido muito mais prazerosa de fazer do que a de hoje provavelmente seria.
Em meio à conversa, distraído, tropeçou e caiu. Com ele, seus
óculos, e o mundo em sua volta ficou ainda mais nebuloso.
Naqueles instantes em que não podia enxergar claramente,
muita coisa se passou na sua cabeça. “E se eu perder esses óculos? E se alguém
pisar? Como vou fazer a prova? Como vou embora dirigindo? O que vou fazer com o
carro se alguém me levar? Por que nunca quis pôr lentes de contato? Por que
isso não aconteceu ontem quando eu estava de carona? “
Então ele ouviu uma voz: “Ei, são seus, né?”
Um borrão cor de pele e amarelo devolveu o par de lentes
para ele.
Ele muito agradecido, não parava de dizer obrigado, se
desculpando por ser tão desastrado e justificando que ano passado isso não
teria acontecido pois ele usava cordinha nos óculos e assim era mais seguro.
E então ele a viu.
E então ele a viu.
Com as lentes ainda um pouco sujas enxergou um sorriso que
ainda não conhecia. E sabia que daquele momento em diante, não tinha mais o que
temer do futuro.
“Quer saber? Acho que vou trocar logo por lentes de
contato... Obrigado mais uma vez, você é a...”
E nunca deixou de gostar do passado. Mas já não sofria.
Não mais.
Não mais.
Um comentário:
Aee ótimo texto.
Gostei muito dos pontos onde ele sempre comenta que ontem ou antes teria sido melhor. Hahahah bem divertido. Só achei que ele se resolveu muito rápido no fim. Mas mesmo assim deu pra entender bem o que aconteceu!
No aguardo de mais postagens !
Abraços
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